Tenho visto nos últimos anos uma demanda crescente por direito a voz, por parte das pessoas que nunca tiveram essa chance. As redes sociais, começando lá atrás com os blogs e hoje com aplicativos sociais que facilitam essa expressão, como Twitter, Facebook, FourSquare, etc., pessoas comuns estão expressando suas opiniões sobre produtos, serviços, estabelecimentos, polÃticos e muito mais.
Isso é bom, certo? Sim, é muito bom. Mas, como tudo e qualquer coisa na vida, tem que ser usado com consciência, com a moderação necessária, para que não exista abuso. E quando digo isso, falo dos dois lados da moeda.
Contextualizando
Falando especificamente de estabelecimentos comerciais e seus consumidores, estamos vivendo uma época de exposição máxima. As pessoas fazem checkins dizendo onde estão, publicam antes pra onde vão, reclamam da demora do pedido enquanto esperam e relatam suas experiências, sejam elas positivas ou negativas, depois. Grande parte dessas pessoas apenas fazem isso mesmo, relatam. E pessoas sempre fizeram isso. Na mesa de bar, em casa, no grupo da igreja, na rua. Existem até pesquisas que inferem a quantidade de relatos que a pessoa fará caso a experiência tem sido boa ou ruim. E experiências ruins ganham de lavada. Isso é pesquisa.
Na Internet não seria diferente, só mais potencializado. As pessoas tendem, levadas pela emoção, a relatar de forma muito mais direta, agressiva e repetitiva, as experiências negativas. E quanto mais negativas elas tenham sido, maior será a exposição. O boca-a-boca virtual está separado por um clique, like, retweet ou share. NotÃcia ruim viaja mais rápido e mais longe na Internet.
Quando começa o abuso? Do lado do consumidor, quando ele percebe o poder que pode ter e utiliza isso de forma consciente para prejudicar o estabelecimento. Também pode acontecer quando é apenas uma reclamação sem muito sentido, apenas para provocar, gerar o burburinho, experimentar seu próprio poder (o ser humano é vaidoso e faz isso sempre).
Mas e do lado oposto, quando há abuso? Quando o próprio estabelecimento ou pessoas ligadas a ele, de forma direta ou indireta (fãs, por exemplo) tentam calar as pessoas que reclamam, estejam elas com ou sem a razão.
BoicotaSP, um exemplo prático
Algumas pessoas se reuniram com a ideia de expor em um site quais os estabelecimentos de São Paulo estariam abusando e extorquindo os seus clientes. Um protesto muito válido, que toda pessoa tem o direito de fazer. Eu dei minha visão sobre o site e torci muito para que as pessoas não perdessem a mão. Perderam.
O que estamos vendo no site, após um sucesso barulhento logo nos primeiros dias, é uma sucessão de opiniões contraditórias, foco em picuinhas, gente tentando testar o seu pequeno poder de persuasão, em sua maioria sem muita razão. E fico muito triste ao dizer isso, pois o potencial do site era enorme, poderia se tornar uma referência, pois todo morador de São Paulo que tem o mÃnimo de consciência sabe que existe – sim – muito abuso. E quem abusa se coloca na cômoda posição do “tem quem pague”, porque realmente tem. Principalmente a Nova Classe B que adora compartilhar que pagou caro em determinado produto, porque é  “selecionado”.
Mas esse abuso do site, das pessoas que compartilharam experiências por lá e infelizmente não foram filtradas pelos administradores, nada se compara ao abuso da censura, imposto por muitos que taxaram-no de “agrupamento de invejosos” desde o inÃcio, quando o site ainda tinha protestos bem válidos. Você percebe a soberba nessa expressão? Quem protesta por preço alto é porque não pode pagá-lo e portanto não passa de um invejoso.
Táticas anti-democráticas
Reduzir o protestante, intimidá-lo ou desacreditá-lo é uma tática antiga, que quem tem mais de 35 anos pode se lembrar de conversas em casa sobre a Ditadura no Brasil. Usam a mesmÃssima tática de quem acusam: o terrorismo. E isso eu combaterei como possÃvel, de qualquer que sejam os lados, qualquer que seja a bandeira, filosofia ou crença.
Enquanto pessoas que pensam diferente tentarem utilizar de sua influência para desacreditar o outro, e com isso saÃrem “por cima”, nunca ninguém poderá falar de democracia por aqui. Democracia, meus amigos, é saber ouvir também as pessoas que pensam diferente de você, e apresentar argumentos para uma discussão que tenha um andamento, não que esbarre nas acusações vazias.
Queremos ver demonstrações mais bacanas, como o SP Honesta, um “protesto ao protesto” do BoicotaSP, que tenta mostrar lugares bacanas na cidade em que paga-se um preço justo, honesto. Por enquanto eles estão listando locais baratos, o que contrapõe exatamente o que criticam no seu opositor, mas eu acredito (I’m a believer) que restaurantes bacanas e com preço justo-mas-não-barato também possam ser listados por lá.
Queremos ver mais demonstrações como a do TubaÃna Bar, que com um texto muito educado, lúcido e transparente, mostrou pro pessoal do BoicoteSP que preço é apenas resultado de custo e valor agregado, e não necessariamente exploração.
Queremos ver, gente, discussões saudáveis e com argumentação inteligente. Queremos que argumentos como “inveja”, “falta de louça pra lavar”, “nazismo” e afins deixem de ser usados, sendo substituÃdos por “fale-me mais sobre isso”, “como você chegou nessa conclusão”, “seus argumentos ainda não me convencem”, “entendo seu ponto de vista, mas veja também por esse lado”.